quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Marcos 1:16-20

16 Caminhando junto ao mar da Galiléia, viu os irmãos Simão e André, que lançavam a rede ao mar, porque eram pescadores.
17 Disse-lhes Jesus: Vinde após mim, e eu vos farei pescadores de homens.
18 Então, eles deixaram imediatamente as redes e o seguiram.
19 Pouco mais adiante, viu Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão, que estavam no barco consertando as redes.
20 E logo os chamou. Deixando eles no barco a seu pai Zebedeu com os empregados, seguiram após Jesus.


A simplicidade e a objetividade com o qual Jesus chamou seus discípulos, descritos nesse trecho espanta, pois parece que Ele os chamou do nada, como se sua figura carismática ou seu status religioso fosse suficiente para magnetizá-los e fazer com que eles comprassem a idéia de serem seguidores de um Rabi que agora aderiu à pregação do arrependimento de João Batista.

Se verificarmos com atenção, estes discípulos foram chamados na Galiléia, o primeiro local onde Jesus começa sua pregação do evangelho do Reino. Impossível não presumir que a unção sobrenatural de Jesus na pregação de sua mensagem, dada pela manifestação do Espírito Santo em sua vida como homem, não provocasse a disseminação da notícia que por aquelas paragens um mestre, um Rabi estava pregando a Palavra com autoridade nunca vista em outro mestre em Israel.

Antes desse convite, Pedro (Simão) e André foram alvos de um milagre de Jesus na pesca maravilhosa descrita em Lucas 5. Tiago e João no mínimo tinham ouvido a mensagem do Mestre ali na Galiléia e, pelo chamado de Cristo a serem seus discípulos, haviam crido em Sua pregação. Pelo modo como Jesus os chama para o discipulado, já deveria haver entre eles algum tipo de relacionamento, possivelmente de ensino pela posição de mestre que Jesus possuía em Israel, mesmo pregando agora a remissão dos pecados pelo arrependimento e pelo batismo.

Seu convite “Vinde após mim, e eu vos farei pescadores de homens”, implicava a uma renúncia pessoal e não familiar. O contexto onde estes foram chamados indica que viviam seu cotidiano de pescadores. Pedro e André, com família para sustentar não poderiam largar tudo ao ouvirem o convite de Cristo, se não tivessem uma infra-estrutura de sobrevivência pela pesca já em funcionamento, para suportar suas responsabilidades como mantenedores da família.

Igualmente Tiago e João, ao ouvirem o convite de Cristo e ao atendê-lo, vemos na passagem que não deixaram suas famílias desamparadas, antes “Deixando eles no barco a seu pai Zebedeu com os empregados, seguiram após Jesus”.

Entendo que de maneira alguma Jesus nos fará um convite a segui-lO se esse convite implicar no desamparo de nossos familiares no que tange a sobrevivência. Antes, como veio cumprir a Lei não poderia, à semelhança da perversão da religiosidade judaica que admitia e incentivava o corbã descrito em Marcos 7:6-13, incentivar à desobediência ao espírito do mandamento de honrar pai e mãe, deixando de ajudar no sustento de sua família já que naquele tempo o núcleo familiar era formado pelos descendentes do patriaraca e seus agregados que juntos trabalhavam para sustentarem-se.

Ora este entendimento, de que o chamado de Cristo para segui-lo é sempre na direção do amor e da compaixão humana, é oposto à aquilo que fomos ensinados e acostumados a entender como verdade, que o ser discípulo implica em negligenciar os cuidados com nossos queridos.

Se estudarmos as linhas e entrelinhas do evangelho como registro histórico, veremos que os três anos e meio de ministério de Jesus não foi passado exclusivamente com os discípulos que Ele chamou para segui-lO. Há outros personagens que O seguiam, não gozando de Sua intimidade como os discípulos -posteriormente elevados a apóstolos-, mas na renovação de seu entendimento na mensagem do evangelho pregado por Cristo, como José de Arimatéia, Lázaro e suas irmãs, a mulher adúltera, a pecadora que O ungiu ou o samaritano que Lhe cedeu o cenáculo para a última ceia.

Libertemo-nos do conceito equivocado que ser chamado para segui-lO significa render-se a um sistema religioso com suas estruturas de poder e opressão. É muito mais do que isso. É integrar o chamado de Cristo ao nosso cotidiano, no entendimento de que a luz do evangelho nos renova a cada dia, compartilhando do bem que a mensagem de Cristo faz em nós e por nós, na certeza de que somos guiados pelo Seu Espírito em toda boa obra.